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Quilômetros da Fé: uma jornada de devoção até o Santuário de Aparecida

Romeiros percorrem enormes distâncias e enfrentam dificuldades carregando promessas, histórias e tradições em um trajeto em prol da fé na Padroeira do Brasil

Por Mayara Abreu

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Romeiros chegam ao Santuário Nacional de Aparecida após uma longa jornada de fé e devoção | Foto: Mayara Abreu

Todos os anos, milhares de pessoas saem de suas casas e enfrentam uma longa jornada a pé até o Santuário Nacional de Aparecida, no interior de São Paulo. Se milhões visitam a Basílica durante o ano, muitos percorrem quilômetros sob sol e chuva, atravessando estradas e trilhas até alcançar o destino. A caminhada é marcada por cansaço e dor, mas, acima de tudo, esperança. Movidos por promessas, e, principalmente, pela fé.

A prática de ir até Aparecida a pé é uma tradição que remonta há décadas. Para muitos, a peregrinação é uma forma de agradecer por bênçãos alcançadas ou pedir auxílio em momentos difíceis. A romaria não é apenas um ato religioso, mas, também, um evento social que une pessoas de diferentes origens e histórias.
 

Segundo a socióloga Gisele Vilalta, a peregrinação é um momento de “introspecção, mas também de coletividade”. “Muitos romeiros encontram na caminhada uma oportunidade de reflexão e renovação espiritual", afirma.
 

A romeira Adriana Araújo destacou a importância da jornada para sua saúde mental. Já são oito anos seguindo os caminhos até Nossa Senhora. “Aqui a gente se sente parte de algo maior. Nossa Senhora Aparecida é meu sustento, amparo e suporte, é como se ela me levasse para onde eu não pudesse caminhar sozinha. Eu venho para agradecer e refletir, é um momento meu e dos meus filhos, mas, ao mesmo tempo, estou cercada por muita gente que compartilha da mesma fé.”

 

A caminhada
 

A reportagem acompanhou romeiros em um ponto de apoio na cidade de Taubaté, pouco mais de 40 quilômetros do Santuário, onde grupos de romeiros fazem pausas para descansar e reabastecer as energias. “Eu caminho há três anos. Comecei porque fiz uma promessa quando operei meu joelho, o médico precisou tirar a cartilagem e não aconteceu nada mais grave, desde então venho todos os anos para agradecer por essa benção”, conta Fernando Guedes, que veio de Jambeiro. Ele percorre mais de 80 quilômetros até Aparecida.

 

A caminhada, claro, é repleta de desafios para o corpo humano. Os romeiros enfrentam condições adversas e, muitas vezes, passam por situações como calor intenso, longas subidas, pouca estrutura em alguns trechos e, esse ano, até chuva na véspera do dia 12 de outubro. Impactos naturais, que, na maioria dos casos, não podem ser controlados.

O geógrafo Brendom Rodarte explica que a geografia e o relevo da região influenciam diretamente a experiência dos romeiros durante a peregrinação.  “Afeta tanto os aspectos físicos do deslocamento quanto a percepção e o simbolismo associado à jornada. O espaço geográfico é um produto da interação entre elementos naturais e sociais, sendo continuamente transformado pela ação humana e pela cultura. Assim, o relevo, a vegetação e os elementos geográficos naturais influenciam tanto a forma como o caminho é percorrido quanto às maneiras pelas quais as práticas culturais, como as romarias, se apropriam desse espaço", destaca o profissional.

Rodarte também menciona que a geografia local cria marcos naturais, como montanhas, rios e florestas, que podem ser carregados de significados religiosos.  “Por exemplo, montes altos muitas vezes são associados à proximidade com o divino, como locais de encontro com o sagrado. A paisagem se torna, assim, não apenas um cenário, mas um elemento ativo na experiência dos romeiros”, completa.

  

Infraestrutura

 

Além do aspecto espiritual, a peregrinação para Aparecida tem um impacto econômico significativo nas cidades pelas quais os romeiros passam. Comércio local, pousadas e restaurantes se preparam para receber os peregrinos durante os meses de maior movimento, especialmente na proximidade do dia 12 de outubro, quando se celebra o Dia de Nossa Senhora Aparecida.

Para muitos estabelecimentos, essa é a principal época do ano, com um aumento expressivo no volume de vendas e na ocupação de hospedagens. Pequenos comerciantes aproveitam a movimentação para vender produtos típicos e lembranças religiosas, como terços, velas e imagens da santa, contribuindo para a economia local. Além disso, há o papel fundamental dos voluntários e organizações religiosas que se mobilizam para oferecer suporte aos romeiros, reforçando o senso de comunidade.

No contexto das peregrinações, a ocupação do espaço ao longo dos caminhos religiosos está diretamente ligada à criação de infraestruturas de apoio, que são estabelecidas para atender às necessidades dos romeiros. Além dos pontos comerciais, muitos espaços de apoio oferecem água, comida e, principalmente, incentivo para continuar. Alguns comerciantes locais e voluntários também se organizam para distribuir alimentos e dar suporte médico aos peregrinos.

“Esses pontos de apoio surgem em locais estratégicos, geralmente nos limites entre terrenos mais difíceis, como regiões montanhosas ou de travessias longas. A ocupação do espaço por esses serviços revela como o espaço geográfico é produzido e organizado em função das práticas culturais e religiosas”, afirma o geógrafo Brendom.

Ao fim da jornada, os romeiros chegam ao Santuário Nacional de Aparecida, muitos com lágrimas nos olhos, emocionados pela superação e pela chegada. Para eles, o destino é mais do que um lugar sagrado — é a realização de um compromisso espiritual, um momento de agradecimento e renovação de fé.

"Cada passo que dou é uma oração", resume Devanildo dos Santos, romeiro emocionado com a peregrinação. "Chegar a Aparecida depois dessa longa caminhada é como chegar a um abraço de mãe."

©️ 2024 por alunos de Jornalismo do 4° semestre da Universidade de Taubaté. Direitos Reservados

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